quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Brasil deve mirar educação na pré-escola, diz ganhador de Nobel de Economia

Educação é dinheiro. E educação nos quatro primeiros anos da vida de uma criança significa ainda mais dinheiro, sugere o economista James Heckman. Premiado com o Nobel de Economia em 2000 pelos trabalhos nos quais criou uma série de métodos para avaliar o sucesso de programas sociais e de educação, Heckman argumenta que, quanto mais tarde o aprendizado chegar às pessoas, menor será o seu efeito e mais caro custará ao País.
O economista está no Rio de Janeiro, onde participou nesta quarta-feira, no Ibmec-RJ, de um seminário em homenagem aos 55 anos do economista Ricardo Paes de Barros, considerado hoje um dos principais especialistas em políticas sociais do Brasil. Na quarta e na quinta-feira, Heckman é a principal estrela de um seminário na Fundação Getulio Vargas, onde pesquisadores estrangeiros e brasileiros vão discutir a educação infantil.


O professor da Universidade de Chicago lembrou na palestra que uma intervenção educacional apropriada na chamada “primeira infância” (até os quatro anos) garante “significativo retorno econômico” a um País – seja rico, pobre ou em desenvolvimento. Para o economista, países como o Brasil só conseguirão realmente alcançar altos índices de produtividade quando mirarem nos anos iniciais. O retorno manifesta-se, por exemplo, no aumento da renda futura, na redução dos custos sociais e na queda da criminalidade, entre outros indicadores. Razão: crianças estimuladas mais cedo chegarão à escola mais preparadas para aprender.

Envolvimento da família

Para comprovar a tese, o Nobel apresentou, ao lado do economista Rodrigo Pinto (também da Universidade de Chicago), os resultados de um estudo sobre o Projeto Pré-Escolar Perry, adotado nos Estados Unidos nos anos 60. O programa tinha como alvo crianças de baixa renda, avaliadas como de alto risco de fracasso escolar. Beneficiários do programa e um grupo de controle foram acompanhados em várias etapas até os 40 anos.

Os resultados mostraram os méritos da intervenção educacional precoce. Para as que estudaram no programa Perry, o número de crianças que quando adultas tiveram renda superior a US$ 2 mil mensais foi quatro vezes maior do que aquelas fora do programa. O Perry também reduziu à metade o número de crianças que usou o seguro desemprego (medida usada para verificar o grau de empregabilidade dessas crianças quando adultas). Para os meninos, o efeito mais importante foi a redução da participação em atividades ligadas ao crime. Houve aumento de QI aos cinco anos de idade e graus mais altos de desempenho no ensino secundário.

“A primeira infância tem muita importância na formação de capacidades, ao criar o ambiente correto para o desenvolvimento físico e psicológico”, resume Heckman. Para o economista, essas capacidades trazem maiores ganhos se lapidadas até os quatro primeiros anos de vida. Ele se refere tanto às habilidades cognitivas convencionais aprendidas na escola – como conseguir enxergar o mundo de forma mais abstrata e lógica – quanto às habilidades não cognitivas, relacionadas ao autocontrole, à motivação e ao comportamento social. As últimas também devem ser estimuladas no começo da vida. “Embora sejam cientificamente menosprezadas por muitos, elas estão diretamente relacionadas ao sucesso na escola – e, mais tarde – no mercado de trabalho”, afirma.

Os estímulos, porém, precisam ocorrer na escola e na família. Daí, segundo Heckman, o sucesso do programa Perry, que envolve os pais no processo educativo. “Sem o amparo dos pais, dificilmente uma criança terá motivação para aprender”, afirma. É por essa razão que uma criança do Nordeste começa a vida em desvantagem em relação a uma do Sudeste, sublinha o economista. A tarefa de programas pré-escolares é tentar atenuar as diferenças no ponto de partida. “A intervenção motiva as crianças e faz com que elas se engajem mais, procurem o conhecimento, estejam abertas à experiência e ao aprendizado. Assim vão aprender melhor nos anos seguintes”, explica.

Mundos distintos

Em outro estudo, feito com o brasileiro Flávio Cunha, Heckman compara dois mundos familiares bem distintos. No primeiro, as crianças vêm de um lar cujos pais leem em voz alta, dão estímulos lógicos e usam um vocabulário amplo. No outro, os pais são analfabetos e não há brinquedos em casa. O estudo constatou que, com um ano de idade, as diferenças são muito pequenas entre as crianças. Aos quatro anos, porém, as disparidades de resultados são “significativas”.

A taxa de retorno no capital humano, segundo os pesquisadores que estudam o tema, equivale ao conceito do retorno do investimento numa ação na bolsa. Heckman afirma que a taxa de retorno de um programa pré-escolar nos EUA é de 6% a 10% ao ano. “As ações na Bolsa têm taxa de retorno média entre 5% e 8%. O programa tem uma taxa de retorno muito boa, com a vantagem de ainda combater as disparidades econômicas”, afirma o economista.

Rodrigo de Almeida, iG Rio de Janeiro

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